terça-feira, 24 de março de 2015

O Maçom no Brasil do Séc. XXII



I
nício do Século XXI e nos perguntamos como estará nosso mundo daqui há 100 anos. Como será nossa vida, nosso dia a dia, e o que a evolução da tecnologia, que não desacelera, irá nos trazer para superar o já tecnológico Século XX?

O XXI nasceu como a era dos celulares, ou melhor, dos “smartphones”, aparelhos que apresentam variedade incrível de modelos, cores, pesos e até de formatos, como os relógios e que já são comuns no mercado.

A tecnologia também é outro fator surpreendente. São tantas “coisas” que podemos fazer hoje com um telefone, desculpem, com um “smartphone”, que se por um lado fica difícil pensar em novidades, por outro, faz com que nossa imaginação voe cada vez mais - pense nos “dromes”.

Dizem que é possível fazer de tudo com eles, os “smarts”, inclusive usá-los como simples telefone, embora para este uso temos visto mais dificuldades do que usá-los para jogos, fotografias, internet ou mesmo para ligar uma TV.

E nessa linha fica a reflexão: será que haverá espaço para a sobrevivência de uma sociedade de homens que se apresenta ainda restrita, com usos e costumes de séculos passados? O que poderemos aspirar, tanto para a Órdem quanto para o maçom do próximo século? Para o maçom no Brasil do Século XXII.

Ao viajarmos nesse pensamento, não podemos deixar de pensar na cadeia de nossa sobrevivência, que vai da qualidade de nosso planeta até as atitudes mais simples das regras de convivência em nossa sociedade.

O otimista supera a realidade da destruição de florestas e das geleiras, do calor, que a cada ano bate novos recordes, e das crises de energia e água, com a esperança de novas tecnologias e o desenvolvimento de engenhocas cada vez mais modernas, além da conhecida adaptação do homem ao seu universo, como bem descreveu Darwin.

O pessimista trata o futuro com base na própria história da humanidade, que apresenta de tempo em tempo, terríveis ciclos de destruições e catástrofes, como o fim dos dinossauros, a queda dos 500 anos de império romano, as guerras mundiais e mesmo doenças como a gripe espanhola e a AIDS, ou seja, a qualquer momento uma nova e grande tragédia vai mudar o mundo e porque não nos próximos 100 anos?     
        
Toda cautela é pouca, mas entre um e outro, preferimos uma posição mais central, “nem muito ao mar, nem muito a terra”, como diriam nossos pais, ou nossos avós, em séculos passados.  Mas antes de pensarmos no futuro, vamos olhar um pouco para o passado. Para os idos de 1822, o ano de nossa Independência, que segundo Laurentino Gomes, no seu livro “1822” (Editora Nova Fronteira, 2010), era um Brasil que “...tinha, de fato, tudo para dar errado...”. Um momento de “... população pobre e carente de tudo, ... economia agrária e rudimentar, dominada pelo latifúndio e pelo tráfico negreiro... O analfabetismo era geral... As perspectivas de fracasso, portanto, pareciam bem maiores que as de sucesso...”, e o “... Brasil conseguiu manter a integridade do seu território e se firmar como Nação independente...". E 1822 foi também um marco para a Maçonaria no Brasil.

No início daquele século, em 1801, foi instalada a primeira loja maçônica brasileira, composta praticamente de homens ligados à nobreza e seus descendentes. Era filiada ao Grande Oriente da França, na época, praticamente um instrumento nas mãos de Napoleão Bonaparte.

Em menos de uma década, a partir de 1809, foram fundadas várias lojas no Rio de Janeiro e Pernambuco, e em 1813 criado o primeiro Grande Oriente Brasileiro, sob a direção de Antonio Carlos Ribeiro de Andrada e Silva, com a clara missão de se afastar da submissão ao Grande Oriente de Lisboa. Era mais um passo para a Independência do Brasil, um desejo do povo brasileiro que crescia a cada dia, principalmente entre os maçons.

Se por um lado as opiniões controversas sobre a influência da Maçonaria nas Revoluções Francesas permeavam a corte no Brasil, por outro, os ideais da Independência eram cada vez mais fortes, motivado principalmente pelas conquistas na América Latina.

No entanto vinha dos Estados Unidos, a maior influência na reforma constitucional em busca da soberania. O grande país da América do Norte declarou sua Independência em 1776 e a conquistou por definitivo em 1783, após vencer a guerra contra a colonização inglesa, com apoio da França e Espanha e principalmente dos maçons, responsáveis diretos pela formação e transformação do país. É possível afirmar que os EUA nasceu maçom.

Em 1787 foi aprovada a sua Constituição, e em 2 de outubro de 1789, elaborado a primeira Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, onde estavam presentes os valores do Iluminismo de Rousseau, ou seja, da liberdade e da igualdade civil, do primado da lei, da propriedade, da necessidade da contenção do poder soberano, da Constituição, da separação de poderes, etc. Era essa a maior mensagem para o maçom brasileiro, que desejava não somente cortar as  amarras de Portugal mas também constituir sua soberania livre e de bons costumes. E esse afastamento de Portugal serviria também para se livrar dos olhos de  Napoleão que caminhava para aumentar seus domínios na Europa.  

A Maçonaria, pelas mãos dos irmãos Andradas, transformou-se num centro de atividade política, base para a difusão dos ideais do liberalismo. E em maio de 1822 se instalou no Rio de Janeiro o Grande Oriente Brazílico, com José Bonifácio de Andrada e Silva o seu primeiro Grão-Mestre, na época muito questionado por outros maçons pela criação da também sociedade secreta, o Apostolado, que apoiado por três colunas fundamentais (Palestras), na primeira delas aparecia a denominação de “Independência ou Morte”, que pouco tempo depois seria utilizado como lema de nossa independência.

Sob a liderança de Gonçalves Ledo, a Loja “Comércio e Artes” trabalhava de forma incansável pela Independência do Brasil, com destaque para o maçom, Capitão-mor José Joaquim da Rocha, responsável pelo planejamento que resultou no “Dia do FICO”, ato de D. Pedro contra a Corte de Lisboa, que insistia em seu retorno a Portugal.
Para Gonçalves Ledo e outros líderes maçônicos, a coroação do movimento viria com a própria iniciação de D. Pedro, o futuro Imperador do Brasil, nos mistérios da Maçonaria, assim como foram outros Imperadores da Europa e os primeiros Presidentes dos EUA.

E no dia 2 de agosto de 1822, na Loja “Comércio e Artes”, por proposta de José Bonifácio, o então Príncipe D. Pedro, que recebeu o nome histórico de “Guatimozim”, em homenagem ao último imperador Asteca morto em 1522, foi iniciado e elevado à Mestre, e em seguida alçado ao posto de Grão-Mestre da Maçonaria no Brasil, o que comprovaria sua íntima ligação com a causa da Independência.

Na histórica sessão de 20 de agosto de 1822, presidida por Gonçalves Ledo, e com D. Pedro ausente, por viagem à São Paulo, foi proposto, e aprovado por unanimidade, “que fosse inabalavelmente firmada a proclamação de nossa independência e da realeza constitucional na pessoa do augusto príncipe”.  Era a proclamação de D. Pedro como Imperador pelos maçons, e que resultou na consagração da Independência em 7 de setembro quando o então Príncipe retornava para o Rio de Janeiro.

A crise aumentou com o confronto direto entre dois grupos de maçons brasileiros. De um lado, José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência do Brasil, Ministro de Dom Pedro I, defensor da última monarquia da América Latina e Grão-Mestre do GOB, que liderava a facção Maçonaria Azul. Do outro, seu 1º Grande Vigilante, Joaquim Gonçalves Ledo,  líder dos maçons da Maçonaria Vermelha, que lutavam ao lado dos  radicais liberais defensores de uma República no Brasil.

E o Imperador, diante dessas lutas e rivalidades entre os próprios maçons, fechou o Grande Oriente, mas não calou os verdadeiros maçons. A busca pela liberdade e igualdade não tinha terminado com a separação de Portugal. Os maçons perderam lideranças e passaram a viver uma crise maior quando em 1864, o Papa Pio XI editou a bula Syllabus, que proibia qualquer ligação da Igreja com a Maçonaria.

Com D.Pedro II no poder foi retornado os laços com os maçons, que passaram a ocupar os principais cargos no Palácio. Mas por ser um país de origem católica, a restrição imposta pela Igreja gerava constantes conflitos.  Vários padres maçons negavam-se a aceitar a determinação de abandonar a Órdem, o que gerou punições tanto por parte da Igreja quanto represálias por parte do Governo. Tal situação se agravaria pois era de conhecimento do Império a participação ativa de diversos grupos de maçons nos movimentos revolucionários em favor da República, existentes mesmo antes de 1822 e denominados de conspiradores.  Assim como a luta pela definição por um Estado laico, com o afastamento da Igreja do poder.

O grupo de maçons contra a monarquia cresce e passa a participar ativamente dos movimentos abolicionistas.  E em 13 de maio de 1888 alcançou o auge com a participação ativa na aprovação da Lei Áurea que libertaria de vez todos os escravos no Brasil. Seria também uma mensagem direta pelo fim do Império e para a implantação da República, que viria a se concretizar logo após a vitória da Tríplice Aliança – Brasil, Argentina e Uruguai – na Guerra do Paraguai com o reconhecimento pelo povo da força e importância do Exército, um verdadeiro viveiro de maçons. Era o elemento que faltava para a criação da República.

O momento era crítico para o reinado. O Imperador D. Pedro II encontrava-se doente e o Império decadente. As elites latifundiárias continuavam contra a Princesa Isabel por sua assinatura na Lei Áurea, e o povo em geral, não aceitava que o Conde D’Eu, um estrangeiro de comportamento controvertido, pudesse ser o futuro Rei do Brasil. Foi quando Benjamin Constant e Deodoro, em reunião secreta com as elites militares, republicanas e maçônicas, decidiram pela queda do Império no Brasil.

Em 15 de novembro de 1889, o Marechal Deodoro, autonomeou-se Chefe do Governo Provisório da República do Brasil, instalando um ministério totalmente maçônico e filiado ao Grande Oriente do Brasil. Na Justiça, Eduardo Campos Sales, Wandenkolk na Marinha, Benjamin Costante na Guerra (Exército), Rui Barbosa indicado para a Fazenda (Finanças), Demétrio Ribeira na Agricultura, Quintino Bocaiúva nos Transporte e Aristides Lobo no Interior. E para consolidar a força da Maçonaria, no dia 19 de dezembro do mesmo ano, o Chefe do Governo, Marechal Deodoro, foi nomeado Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil.

Um ano depois, em 15 de novembro de 1890, foi instalada a Assembléia Constituinte que promulgou a Constituição de 24 de fevereiro de 1891 e implantou o presidencialismo e o federalismo na República Federativa do Brasil. O governo provisório foi encerrado em 26 de fevereiro do ano seguinte com a eleição de Deodoro como o Primeiro Presidente, e para Vice-Presidente, o Marechal Floriano Peixoto, Ajudante General do Exército.

A República nasceu no meio de crises, principalmente entre o Exército e a Marinha, que não aceitava ter sido derrotada na eleição para a Vice-Presidência, e no dia 23 de novembro de 1891, o Marechal Deodoro se viu obrigado a renunciar ao cargo para não provocar uma guerra civil. Desgostoso e doente, no dia 18 de dezembro do mesmo ano, renunciou também ao Grão-Mestrado.

Assume o Vice-Presidente Marechal Floriano Peixoto, maçom que passará à história como o Consolidador da República e que irá transmitir o poder para os presidentes civis, a maioria deles maçons, que com o apoio de uma sociedade secreta de origem alemã e maçônica, de ideais republicanos e iluminista, a Burschenschaft, ou simplesmente Bucha, ajudará a administrar o ciclo político conhecido como a República Velha ou das Oligarquias, que durará até a Revolução de 1930.  A partir de então a Maçonaria passa a perder o poder de influência no Estado brasileiro.

Até a metade do século XX, a Maçonaria enfrentou períodos de crises e perseguições, principalmente no decorrer das Grandes Guerras. O pós-guerra, foi também turbulento, e a ação da maçonaria, inclusive no período da ditadura militar, não foi relevante no cenário político. A partir do final dos anos 70, o Brasil vive seu maior ciclo democrático, com fortalecimento das instituições democráticas e republicanas, conquista a liberdade de expressão, moderniza-se e melhora sua economia.  Sem participar de ações diretas ou indiretas, a atuação da Maçonaria passa a se concentrar, salvo raríssimas exceções, nas áreas cultural e social.

O maçom volta-se mais para a ritualística, para o estudo da formação do homem. Os Grandes Orientes e as Grandes Lojas se reúnem com o objetivo principal de apreciarem e reverem seus mais diversos rituais vendo surgir, no Brasil e no mundo, novos grupos de maçons independentes, inclusive femininos.

A dificuldade de realizar programas sociais, assim como a necessidade de recursos para a própria sobrevivência, e a sensível redução do número de iniciados, são motivos para que as Lojas continuem a restringir o acesso de camadas sociais de menos recursos aos seus quadros, o que mantém a visão de outras épocas, de que a Maçonaria é uma sociedade para as elites.

E essa é a característica do maçom do século XX, que contraria para muitos a história de lutas e conquistas políticas da Maçonaria de séculos anteriores. A nova realidade gera certo desconforto quando se deparam grupos que defendem o retorno da Maçonaria às causas políticas e outros, a maioria, que vêm a organização como uma entidade social quase que exclusivamente voltada para a filantropia, mas que pouco consegue realizar, seja pela falta dos metais (dinheiro), por  ausência de força política, ou mesmo por  desinteresse de grupos (Lojas) que não conseguem unir-se para o desenvolvimento dessas causas sociais.

No final de nosso século XX, o Brasil passa a viver momentos turbulentos na política e no seu dia a dia. A corrupção, as improbidades administrativas, o crime nas ruas, as drogas, passam a ser manchetes diárias nos jornais. E na Maçonaria crescem movimentos não somente com o desejo de lutar contra esses males mas também de criar ações para valorizar bens como a educação, o trabalho e a família, esta a célula mais importante para a formação e manutenção de um povo.

Para tanto, surge a necessidade de um melhor padrão de recrutamento para os novos maçons.  Observa-se o desejo na busca de elementos que sejam bem colocados em suas áreas de atividades. Que possuam o perfil de liderança e que estejam dispostos a fazer um pouco mais pela sociedade sob o terno preto da Maçonaria.

Não podemos mais viver dos louros de um passado cada vez mais remoto. As conquistas alcançadas devem ser exaltadas, lembradas, gravadas, mas não podemos deixar de viver o presente, de participar de forma ativa para a melhoria da sociedade, pois o futuro depende de hoje e a Maçonaria tem que se reestudar, se fortalecer, se adaptar aos novos tempos para que possa cumprir seu papel de tornar o mundo melhor.
O maçom do próximo século XX será fruto de nossa atuação com vistas à reconstrução social e cultural e a luta contra as mazelas e desigualdades que permeiam o início desse século XXI.

Não acreditamos que o futuro seja predeterminado pelo passado, vitorioso ou não, e nem mesmo pelas condições vigentes. Entendemos que temos que construir esse futuro e para tanto, o maçom, como homem livre e bons costumes, deve participar diretamente neste processo.

São muitos os desafios. Hoje somos reféns de planejamentos econômicos mal sucedidos e de políticos inescrupulosos que infestam os poderes. A inflação ameaça e a diferença entre ricos e pobres permanece em proporção inadmissível. A educação evolui numa taxa mínima, digna de país de terceiro mundo. O meio ambiente não tem a atenção que o mundo moderno cobra. O que fazer neste século para preparar o maçom do século XXII?

Será que teremos tempo suficiente para intervir nesses pontos críticos? Ou será que devemos manter a posição de uma sociedade cultural e social, voltada para a filantropia dos reféns de uma sociedade democrática em crise?

Cem anos é um bom espaço de tempo. É suficiente para planejamentos de médio e longo prazo, mas que não pode ser realizado se ficarmos “sentados em berço esplêndido”.  A Maçonaria deve repensar seu rumo, amadurecer suas ideias e buscar resultados imediatos e mediatos para a criação de um futuro que parece longe mas que não é tanto assim.

A verdade é uma só, vamos colher o que plantar, e temos que conhecer muito bem o solo e o que se deve nele utilizar. Percebemos com a chegada de novos Aprendizes que existe possibilidade de mudanças. Grupos de maçons já unem esforços para a identificação de metas e propostas que vão além da ritualística e das filantropias de pouco alcance.

É possível observar o uso de técnicas mais elaboradas assim como o uso da informática e da informação em nível bastante elevado, inclusive no caminho para a efetiva participação na vida pública do país. É o caminho certo?

Como nação, entendemos que nós, cidadãos, devemos ter nossos direitos expressos, assim como o dever de participar no sistema político que deve estar preparado para proteger esses direitos. É a essência da democracia, da luta pela proteção à liberdade, de ir de encontro à vontade da maioria, do incentivo aos direitos individuais e da proteção aos direitos humanos fundamentais.

E nesta linha de pensamento, o maçom neste século XXI tem que se preparar para não para ser mero coadjuvante, deverá entrar em cena como ator capaz de discutir e elaborar propostas para as questões que abalam o país. É imprescindível conhecer os mecanismos que levam o país para a inflação, a sua política social, como tratar a pobreza, as drogas, educação e o meio ambiente, e para isso deverá também estar preparado para ser um legítimo representante do povo, apoiado pela Maçonaria e presente em todos os poderes de nossa República.

É uma visão que não compete com as ações filantrópicas nem com o aprendizado em Templo, muito pelo contrário, uma está ligada diretamente às outras que se unem para o bem da sociedade.  E se o maçom do século XXI conseguir atingir a base desses objetivos, com certeza terá plantado o maçom do século XXII, que poderá voltar a ter o papel principal de uma sociedade justa e perfeita que tanto sonhamos.




J Neto.´.
Mar/15